terça-feira, 22 de março de 2016

domingo, 6 de setembro de 2015

USO CALVIN KLEIN. [MAS] ANDO DE ÔNIBUS

“Neguinho não lê, neguinho não vê, não crê, pra quê?
Neguinho nem quer saber
O que afinal define a vida de neguinho?”. Gal Costa – Neguinho.
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 Camisa Calvin Klein:  R$ 160,00. Tênis Nike: R$ 300,00. Iphone 6 plus: R$ 3000. ÓculosCarmen Stefan: R$ 245,00. Cueca Calvin Klein: R$ 85,00. Calça jeans Colcci: R$ 235,00. Mochila Nike: R$255,00. É assim que ele sai para trabalhar num dia comum. Apesar de ter estudado em escolas caras de Santa Catarina e ter tido acesso aos cursinhos preparatórios [CAROS!] para a prova de vestibular, Gustavo acabou fazendo uma licenciatura, o que é, geralmente, destinada à população pobre do Brasil como uma das poucas formas de ingresso em universidades públicas. Não ter passado no vestibular para Medicina, por três vezes consecutivas, foi como soco no seu ego.
Para fugir do estigma de professor, ele afirma que ESCOLHEU SER PROFESSOR E QUE ISSO SEMPRE ESTIVERA EM SEUS SONHOS E PLANOS. “Afinal, eu sempre estudei numa das melhores escolas de minha cidade. Só não passei em Medicina por conta das malditas cotas. Letras, História, Pedagogia, Geografia… Isso é para pobre. Para quem estudou pouco. Exatas sim… isso é complexo. Até eu posso dar uma aulinha de História do Brasil ou de Literatura. É muito fácil… Não quero viver a vida toda em educação básica. Também coisa de pobre. Faculdades EaDs? Coisa de gente preguiçosa e muito ruim. Odeio sala aula… Como uma pessoa passa a vida inteira neste inferno? Eu não! Eu sou diferente. Até Inglês eu sei falar. Fiz o curso advanced do Fisk…”. São essas as pérolas emitidas e reafirmadas por Gustavo que é evangélico e não se reconhece enquanto negro, licenciando e [PASMEM (??)] gay! Gustavo é gay. Todos sabem disso. Mas, como ele é “rico”, tem pai também “rico” e protetor [leia-se macho-alfa] e família influente, “ele é apenas educado e talentoso”, afirma o senso-comum que é subalterno sempre às [CHAMADAS] elites.
Eis que hoje Gustavo tem que pegar um ônibus, pois seu pai viajou; ele, preguiçoso, não quis aprender a dirigir e gasta tanto com roupas e sapatos, algo geralmente associado ao universo feminino, que não pôde nem comprar uma moto popular.
Ele acorda cedo, coloca os óculos Carmen Stefan no rosto e sai, detestando ter que trabalhar para pagar as prestações de seu quinto Iphone 6 plus, pois foi inúmeras vezes assaltado. Para ele, isso é um troféu. “Fui assaltado quatro vezes! Mas eu posso comprar quantos Iphones eu quiser…”.
Gustavo, gay reacionário e evangélico, acha que Deus cura quem é gay e votou nas eleições de 2014 em Marina Silva, pois ela levará a palavra de Deus ao Brasil, provando que é contraditório ao extremo. Realmente ele crê que ser bichinha-pão-com-ovo é coisa de pobre. “Se eu um dia me assumir, será quando eu tiver doutorado em Física. Aí sim eu terei reconhecimento e dinheiro para calar a boca de todo mundo”.
Ele pega o ônibus e NÃO! “Aquela bicha pobre, professor de inglês, no mesmo ônibus que eu? Eu detesto ele. Veja suas roupas… Só poderia ter feito Letras com Inglês mesmo… Nunca terá ascensão social. No máximo fará uma pós-graduação numa faculdade EaD. Merda, terei que dar ‘bom dia’ ainda. Era só o que faltava”.
– Bom dia, Ricardo.gay-boysok
Ricardo, professor de Inglês na mesma escola que Gustavo, responde educadamente e pensa: “tenho que escrever sobre esse episódio: a bicha rica, ostentando marcas, pegando o mesmo ônibus que eu? Este conto já tem um nome:
Uso Calvin Klein. [MAS] Ando de ônibus”.
“Neguinho compra 3 TVs de plasma, um carro, um GPS
E acha que é feliz
Neguinho também só quer saber de filme em shopping […]
Neguinho que eu falo é nós”. Gal Costa – Neguinho.

MUITO ALÉM DO ARCO-ÍRIS: AMOR, SEXO E RELACIONAMENTOS NA TERAPIA HOMOAFETIVA – UM TEXTO DE OPINIÃO

Ancorado na curiosidade sobre terapia psicológica e também sobre o sofrimento psíquico enfrentando por homossexuais, eu busquei livros que tratassem desse tema. Eis que em uma visita à livraria encontro o livro “Muito além do arco-íris: amor, sexo e relacionamentos na terapia homoafetiva” de Klecius Borges. De imediato eu fui fisgado pelo título. Parecia que nele estava o que precisava, inclusive para pensar no caso de começar a fazer a terapia. Sou, como alguns dizem, autossuficente quando se trata do conhecimento; uma espécie de autodidata acerca de tudo o que quero e preciso saber. Então, comecei a leitura ininterrupta.
Este livro foi escrito por Klecius Borges, psicólogo que se dedica ao atendimento de gays, bissexuais e seus familiares e a escrita se desenvolve como o que me parece ser uma sessão de terapia: o paciente relata suas problemáticas e Klecius, caucado em sua formação, tenta “solucionar” o problema, isto é, em ajudar ao paciente.
O livro é dedicado a Rodnei Tiago, companheiro de Klecius, como pode-se ler:
“A Rodnei Tiago,
querido companheiro
e parceiro na emocionante
aventura da vida a dois” (BORGES, 2013, p. 6).
Isso, para mim, é muito significativo, pois o autor deixa bem claro que, além de ser especialista tanto em psicologia e em psicologia da diversidade sexual, como ele mesmo preferiu cunhar sua especialidade, ele é gay e vive sua condição de forma livre e sem medos.
Além disso, o livro é separado em parte 1, chamada de Terapia, e em parte 2, chamada deOutras narrativas.
Os temas são sobre o universo de homossexuais (masculinos e femininos, apesar de perceber, quantitativamente, um maior índice de relatos de homossexuais masculinos, algo que pode ser interpretado em outro momento). Os títulos dos capítulos são, por exemplo, o medo de amar, a dor da traição, só os machos, monogamia e exclusividade sexual, amores plurais, etc. É importante lembrar ainda que os nomes das personagens do livro em questão são fictícios e Klecius Borges se inspirou em relatos de seus pacientes.
Um capítulo que me chamou muito a atenção foi o “luto sem fim”, no qual Izabel, 67 anos, relata a sua história de sofrimento com uma companheira com uma doença terminal. Gostei também de “só e feliz”, no qual Guilherme, 38 anos, procura a terapia por se sentir pressionado pelos amigos por conta de seu modo de vida: ele não gosta de ter relacionamentos “sérios”. Ao contrário, ele vive bem sozinho e vivendo várias relações sem se prender a uma pessoa exclusivamente.
Além desse, fiquei fascinado pela história de Léo, 34 anos, no capítulo amores plurais, no qual Léo se relaciona com Samuel, mas este último não consegue namorar apenas uma pessoa. Ou seja, Samuel é adepto ao poliamor[1], embora não saiba acerca disso.
O livro conta com 108 páginas e com uma linguagem muito acessível. Dessa forma, atende desde um adolescente em conflito com sua sexualidade, até uma pessoa com um maior letramento de vida. É, desse modo, um livro que me fez bem, fazendo-me refletir sobre minha condição no mundo e, por isso, recomendo à leitura, uma vez que imagino que muitas pessoas necessitam dessa reflexão interior para, assim, se entenderem e, a partir disso, terem paz com suas sexualidades.
Referências:
BORGES, Klecius. Muito além do arco-íris: amor, sexo e relacionamentos na terapia homoafetiva. São Paulo: GLS, 2013.
[1] “POLIAMOR” É UM TIPO DE RELAÇÃO EM QUE CADA PESSOA TEM A LIBERDADE DE MANTER MAIS DO QUE UM RELACIONAMENTO AO MESMO TEMPO. DISPONÍVEL EM: HTTP://WWW.POLIAMOR.PT/. ACESSADO EM 25 DE JANEIRO DE 2015.